Universidade Católica Dom Bosco

FERNANDO ULISSES ROSALINO
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“Lúcida Loucura”

 

Afinal, o que é a loucura, então?

A possessão demoníaca medieval?

Ou nos tempos do Racionalismo, é a perda da razão?

O portador de informações equivocadas ou incoerentes, na Era Digital?

 

Seria o grito no silêncio, o sorriso da tristeza?

O  tormento e a dor perante as tantas loucuras deste mundo milenar?

A saída criada pelo ser para lidar com o sofrimento e sua falta de beleza?

A expressão, assim, da própria criatividade; descobrindo que enlouquecer é suportar?

 

Seria como uma arte? Pintando o novo entre as rígidas regras estabelecidas?

Não ser só mais um, igual. É polemizar a homogeneidade, o conceito de normalidade?

Questionar: para que tudo certinho, previsível, conforme mandam as regrinhas...?

Talvez a ousadia condenada da franqueza límpida, perante a hipocrisia da sociedade.

 

Ou, também, o puro sofrimento, a dor, a tentativa de mudar, de se superar.

O desespero, as lágrimas, o suicídio, a incompreensão; viver se torna doloroso

Pessoas se afastam daquele que um dia, ainda nenê, nem sonhou por isto passar

Fardo e despesas aos parentes; busca de cura: exorcismo ou um remédio milagroso

 

Na Grécia Antiga, Oráculo admirado e consultado, hoje, alucinado.

Nas batalhas, grande desbravador, líder, temido, bravo guerreiro

Hoje, psicopata, sem honrarias, pelo contrário, desvalorizado.

Antes, a melancolia dos grandes filósofos e pensadores, do poeta e do cancioneiro

 

Mas, hoje, a depressão do tido por chato. E sedado por essa moda de medicamento.

O autista em seu mundo; os transtornos de ansiedade.

Pânico, manias e fobias: tantas questões para ainda entendermos sobre o sofrimento.

A ciência se sente pequena, diante de tanta complexidade.

 

Esquizofrenia, anorexia, histeria, surto, epilepsia, demência, obsessão...

Quantos pontos de interrogação existem do nosso pensar sobre o nosso pensar?

A mente tentando entender a mente. É o mistério da existência sempre em expansão.

Certas condutas, por que? Mas, também, por que não? Viver não é desafiar?

 

Há quem veja muita alegria na loucura.

Em inventar sua própria realidade.

Não ligar para o que digam; sorrir se a vida é dura.

Ser original, excêntrico, não tão sério, brincar com o mundo; ousar crer na felicidade...

 

Mas, também há o outro lado: famílias sofrendo perante o vício e a dependência

Dos que precisam muito de uma ajuda qualquer

De um profissional de saúde mental, com emergência

Que o psicólogo lhe auxilie a reencontrar um momento de paz sequer

 

E a loucura do mundo? A desigualdade social, a injustiça, as maldades coletivas?

A politicalha, a corrupção, a guerra, a falsidade?

O preconceito, ficar horas na frente de uma TV; estresse no trânsito, brigas e intrigas.

Inquisição, orgulho desmedido, sadismo, disputa de poder..., não é louca esta realidade?

 

A mesma que julga o anormal?

Mas, afinal, o que é a loucura então?

A essência latente de cada um, a ontologia existencial?

Um desafio sedutor para a Psicologia; uma ameaça à Lei e à ordem, a contravenção?

 

Um mistério, uma incógnita, uma perpétua indagação?

É o que, ao mostrar algumas virtudes da loucura, salienta o defeito da normalidade?

Realça a beleza do imperfeito; o tédio previsível, padronizado, da perfeição?

É o desrespeito à insanidade da sociedade?

 

Ou, apenas um sofrimento psíquico que precisa de uma terapia e uma medicalização?

É a real percepção das durezas desta realidade e das dores do mundo?

Mas, afinal, o que é a loucura, então?

É o barbudo no sinal, o Napoleão Bonaparte, o Jesus, o que imita o pássaro voando?

 

Mas, não consigo entender, já estou obcecado, atormentado. Dê-me uma pista:

Por favor me digam: afinal, o que é a loucura, então?

Não, não. Não precisam dizer. Já sei. É a falta de resposta ou de uma outra resposta.

O silêncio, a resposta incomum; o não ter que responder; a liberdade do não.

 

Talvez é o responder com outras perguntas; não fechar; é o não ter que ter explicação.

E nem a si próprio fazer sentido. Ou construir um outro sentido...

Talvez, talvez, talvez. Quanta suposição.

Mas, e daí? Julgue-me. Já aprendi a lógica do outro sentido; do desconhecido.

 

E, enfim, o que é a loucura então?

É o talvez, o quem sabe, é tudo isso e nada disso; é o nosso desconhecimento.

Para os políticos, é a desordem; o risco de mudança, de alteração.

Para a indústria farmacêutica é o vertiginoso enriquecimento.

 

Para o poeta, é um rico tema para reflexão

Para a platéia, é o riso, a graça, a felicidade.

Para as artes e a música, um perfil e uma dinâmica merecedora de veneração

Para a Psicologia, é a si própria, sua essência; seu ser; sua realidade...

 

E para o louco, o que é a loucura afinal?

Entre o ‘normalzinho’ e o ‘maluco beleza’, cada um tem a sua definição.

Com qual você fica? Olhe lá, veja bem, escolha em silêncio; disfarce sua verdade crucial

Não faça alarde; os que disfarçam podem descobrir o lado anormal de seu coração.

 

E aí vem a rotulação: um diagnóstico, o código da doença, o preconceito, a licença...

Remedinho; gastos e mais gastos. Por vezes, longas psicoterapias.

Caiu a máscara. Os mascarados descobriram. Mas, não perca a esperança.

Você tem força e opção, para quando compensar e desejar usá-las.

 

Mas, se precisar, a Psicologia estará ali; pronta para tentar lhe auxiliar.

Caso assim seja de vosso desejo, evidente. De todo modo, caso não,

Todos nós, normal, louco, a poesia,a Psicologia..., continuaremos a perguntar:

Mas, afinal, o que é a loucura, então??? (...)

 

Sem a pretensão de responder, mas pelo puro prazer de sempre indagar

Isso, em si, já pode conotar insanidade.

Pode desvelar aquela máscara e, assim, revelar.

Mas, pelo menos, seguimos com o nosso prazer de questionar esta lógica da realidade.

 

E a normalidade: mero conceito estatístico, ditadura da maioria?

Ou determinado por padrões culturais ás vezes questionáveis?

Ou um conceito subjetivo: cada um deve saber de seu sofrimento e de sua agonia

Psicopatologia, transtornos mentais: quantas históricas polêmicas insuperáveis.

 

Lobotomia, choque elétrico no cérebro, hipnose, psicoativos, sessões e internação

O que eu tenho doutor? Preciso de duas palavras: um diagnóstico e um medicamento

Uma personalidade única em sofrimento, crendo que a ‘cura’ está na rotulação...

Mas, o que tantos anos de estudos, o que a Ciência pode fazer neste sentido?

 

Tantos compêndios, manuais, classificações e conceitos

Patoplastia, prodromia, iatrogenia, patognomônico, etiopatogenia...

Pois é, e para além de sinas e sintomas, existem pessoas com sofrimentos

E a Ciência com seus questionamentos; as investigações e os desafios para a Psicologia

 

Delírio, alienação, psicose, neurose, borderline, bipolar...

Inapetência, anedonia, astenia, verborragia

Hipercinético, distúrbio de conduta, desintegrativo, hipotimia, enurese; auto-flagelar

Neurolépticos, catecolaminas, benzodiazepínicos, CID, DSM, amnésia e parafilia

 

Fator genético; exógeno; Interacionismo; Semiologia...

Lesão, agravo, trauma, deficiência, doença, transtorno, disfunção

Termos, conceitos, estudos; e quão pequena é a Psicologia, Psiquiatria e Neurologia

Boa parte, meras conjecturas, hipóteses, crenças...; mas boa parte não se tem explicação

 

Alterações na aparência, na consciência, na memória...; eis a hora de tratar.

Obnubilado, torpor, descarrilhamento da fala, hipoprosexia...; toda propedêutica, e aí?

Precisamos ajudar esta pessoa de carne, osso e sentimentos; ao menos tentar.

Muitas vezes nos sentimos impotentes, mas, para os leigos, e daí?

 

Belíssima e árdua profissão

Cuidar da saúde mental

Sempre lembrando que saúde é também contextual; não só células sem relação...

E entre tantos desafios e mistérios da existência humana, ainda surge a doença mental

 

Presente e junto ao homem desde os primórdios; jamais deixando-o só com a sanidade

E esta velha acompanhante de nossa longa jornada

Vem mostrando-nos outros entendimentos e enfrentamentos da realidade

Mas, tudo o que a Ciência vem desvendando, claro, é muito digno e não foi por nada

 

Ainda somos pequenos, mas não importa; não temos que ter sempre respostas para tudo

Mas, entre outras, uma em especial, ainda persiste: afinal, o que é a loucura então?

É a convenção mutável de critérios da APA, OMS e demais clássicos do mundo?

Ou o puro prazer de não ter resposta e de continuar a histórica indagação?

 

Pois é, mas nesta redundância, como já dito, aquela máscara pode se desvelar

E mostrar aos demais de máscaras, crianças por dentro, a onipresente insanidade

Enquanto algo intrínseco a todos nós, que tememos e continuamos a indagar

Pois tudo isso é a lúcida loucura da busca pela felicidade!!!

 

 

 

Profº. Psi. Me. Fernando Ulisses Rosalino

Primavera de 2013

Curso Psicologia UCDB

 

“Lúcida Loucura”
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