Afinal, o que é a loucura, então?
A possessão demoníaca medieval?
Ou nos tempos do Racionalismo, é a perda da razão?
O portador de informações equivocadas ou incoerentes, na Era Digital?
Seria o grito no silêncio, o sorriso da tristeza?
O tormento e a dor perante as tantas loucuras deste mundo milenar?
A saída criada pelo ser para lidar com o sofrimento e sua falta de beleza?
A expressão, assim, da própria criatividade; descobrindo que enlouquecer é suportar?
Seria como uma arte? Pintando o novo entre as rígidas regras estabelecidas?
Não ser só mais um, igual. É polemizar a homogeneidade, o conceito de normalidade?
Questionar: para que tudo certinho, previsível, conforme mandam as regrinhas...?
Talvez a ousadia condenada da franqueza límpida, perante a hipocrisia da sociedade.
Ou, também, o puro sofrimento, a dor, a tentativa de mudar, de se superar.
O desespero, as lágrimas, o suicídio, a incompreensão; viver se torna doloroso
Pessoas se afastam daquele que um dia, ainda nenê, nem sonhou por isto passar
Fardo e despesas aos parentes; busca de cura: exorcismo ou um remédio milagroso
Na Grécia Antiga, Oráculo admirado e consultado, hoje, alucinado.
Nas batalhas, grande desbravador, líder, temido, bravo guerreiro
Hoje, psicopata, sem honrarias, pelo contrário, desvalorizado.
Antes, a melancolia dos grandes filósofos e pensadores, do poeta e do cancioneiro
Mas, hoje, a depressão do tido por chato. E sedado por essa moda de medicamento.
O autista em seu mundo; os transtornos de ansiedade.
Pânico, manias e fobias: tantas questões para ainda entendermos sobre o sofrimento.
A ciência se sente pequena, diante de tanta complexidade.
Esquizofrenia, anorexia, histeria, surto, epilepsia, demência, obsessão...
Quantos pontos de interrogação existem do nosso pensar sobre o nosso pensar?
A mente tentando entender a mente. É o mistério da existência sempre em expansão.
Certas condutas, por que? Mas, também, por que não? Viver não é desafiar?
Há quem veja muita alegria na loucura.
Em inventar sua própria realidade.
Não ligar para o que digam; sorrir se a vida é dura.
Ser original, excêntrico, não tão sério, brincar com o mundo; ousar crer na felicidade...
Mas, também há o outro lado: famílias sofrendo perante o vício e a dependência
Dos que precisam muito de uma ajuda qualquer
De um profissional de saúde mental, com emergência
Que o psicólogo lhe auxilie a reencontrar um momento de paz sequer
E a loucura do mundo? A desigualdade social, a injustiça, as maldades coletivas?
A politicalha, a corrupção, a guerra, a falsidade?
O preconceito, ficar horas na frente de uma TV; estresse no trânsito, brigas e intrigas.
Inquisição, orgulho desmedido, sadismo, disputa de poder..., não é louca esta realidade?
A mesma que julga o anormal?
Mas, afinal, o que é a loucura então?
A essência latente de cada um, a ontologia existencial?
Um desafio sedutor para a Psicologia; uma ameaça à Lei e à ordem, a contravenção?
Um mistério, uma incógnita, uma perpétua indagação?
É o que, ao mostrar algumas virtudes da loucura, salienta o defeito da normalidade?
Realça a beleza do imperfeito; o tédio previsível, padronizado, da perfeição?
É o desrespeito à insanidade da sociedade?
Ou, apenas um sofrimento psíquico que precisa de uma terapia e uma medicalização?
É a real percepção das durezas desta realidade e das dores do mundo?
Mas, afinal, o que é a loucura, então?
É o barbudo no sinal, o Napoleão Bonaparte, o Jesus, o que imita o pássaro voando?
Mas, não consigo entender, já estou obcecado, atormentado. Dê-me uma pista:
Por favor me digam: afinal, o que é a loucura, então?
Não, não. Não precisam dizer. Já sei. É a falta de resposta ou de uma outra resposta.
O silêncio, a resposta incomum; o não ter que responder; a liberdade do não.
Talvez é o responder com outras perguntas; não fechar; é o não ter que ter explicação.
E nem a si próprio fazer sentido. Ou construir um outro sentido...
Talvez, talvez, talvez. Quanta suposição.
Mas, e daí? Julgue-me. Já aprendi a lógica do outro sentido; do desconhecido.
E, enfim, o que é a loucura então?
É o talvez, o quem sabe, é tudo isso e nada disso; é o nosso desconhecimento.
Para os políticos, é a desordem; o risco de mudança, de alteração.
Para a indústria farmacêutica é o vertiginoso enriquecimento.
Para o poeta, é um rico tema para reflexão
Para a platéia, é o riso, a graça, a felicidade.
Para as artes e a música, um perfil e uma dinâmica merecedora de veneração
Para a Psicologia, é a si própria, sua essência; seu ser; sua realidade...
E para o louco, o que é a loucura afinal?
Entre o ‘normalzinho’ e o ‘maluco beleza’, cada um tem a sua definição.
Com qual você fica? Olhe lá, veja bem, escolha em silêncio; disfarce sua verdade crucial
Não faça alarde; os que disfarçam podem descobrir o lado anormal de seu coração.
E aí vem a rotulação: um diagnóstico, o código da doença, o preconceito, a licença...
Remedinho; gastos e mais gastos. Por vezes, longas psicoterapias.
Caiu a máscara. Os mascarados descobriram. Mas, não perca a esperança.
Você tem força e opção, para quando compensar e desejar usá-las.
Mas, se precisar, a Psicologia estará ali; pronta para tentar lhe auxiliar.
Caso assim seja de vosso desejo, evidente. De todo modo, caso não,
Todos nós, normal, louco, a poesia,a Psicologia..., continuaremos a perguntar:
Mas, afinal, o que é a loucura, então??? (...)
Sem a pretensão de responder, mas pelo puro prazer de sempre indagar
Isso, em si, já pode conotar insanidade.
Pode desvelar aquela máscara e, assim, revelar.
Mas, pelo menos, seguimos com o nosso prazer de questionar esta lógica da realidade.
E a normalidade: mero conceito estatístico, ditadura da maioria?
Ou determinado por padrões culturais ás vezes questionáveis?
Ou um conceito subjetivo: cada um deve saber de seu sofrimento e de sua agonia
Psicopatologia, transtornos mentais: quantas históricas polêmicas insuperáveis.
Lobotomia, choque elétrico no cérebro, hipnose, psicoativos, sessões e internação
O que eu tenho doutor? Preciso de duas palavras: um diagnóstico e um medicamento
Uma personalidade única em sofrimento, crendo que a ‘cura’ está na rotulação...
Mas, o que tantos anos de estudos, o que a Ciência pode fazer neste sentido?
Tantos compêndios, manuais, classificações e conceitos
Patoplastia, prodromia, iatrogenia, patognomônico, etiopatogenia...
Pois é, e para além de sinas e sintomas, existem pessoas com sofrimentos
E a Ciência com seus questionamentos; as investigações e os desafios para a Psicologia
Delírio, alienação, psicose, neurose, borderline, bipolar...
Inapetência, anedonia, astenia, verborragia
Hipercinético, distúrbio de conduta, desintegrativo, hipotimia, enurese; auto-flagelar
Neurolépticos, catecolaminas, benzodiazepínicos, CID, DSM, amnésia e parafilia
Fator genético; exógeno; Interacionismo; Semiologia...
Lesão, agravo, trauma, deficiência, doença, transtorno, disfunção
Termos, conceitos, estudos; e quão pequena é a Psicologia, Psiquiatria e Neurologia
Boa parte, meras conjecturas, hipóteses, crenças...; mas boa parte não se tem explicação
Alterações na aparência, na consciência, na memória...; eis a hora de tratar.
Obnubilado, torpor, descarrilhamento da fala, hipoprosexia...; toda propedêutica, e aí?
Precisamos ajudar esta pessoa de carne, osso e sentimentos; ao menos tentar.
Muitas vezes nos sentimos impotentes, mas, para os leigos, e daí?
Belíssima e árdua profissão
Cuidar da saúde mental
Sempre lembrando que saúde é também contextual; não só células sem relação...
E entre tantos desafios e mistérios da existência humana, ainda surge a doença mental
Presente e junto ao homem desde os primórdios; jamais deixando-o só com a sanidade
E esta velha acompanhante de nossa longa jornada
Vem mostrando-nos outros entendimentos e enfrentamentos da realidade
Mas, tudo o que a Ciência vem desvendando, claro, é muito digno e não foi por nada
Ainda somos pequenos, mas não importa; não temos que ter sempre respostas para tudo
Mas, entre outras, uma em especial, ainda persiste: afinal, o que é a loucura então?
É a convenção mutável de critérios da APA, OMS e demais clássicos do mundo?
Ou o puro prazer de não ter resposta e de continuar a histórica indagação?
Pois é, mas nesta redundância, como já dito, aquela máscara pode se desvelar
E mostrar aos demais de máscaras, crianças por dentro, a onipresente insanidade
Enquanto algo intrínseco a todos nós, que tememos e continuamos a indagar
Pois tudo isso é a lúcida loucura da busca pela felicidade!!!
Profº. Psi. Me. Fernando Ulisses Rosalino
Primavera de 2013
Curso Psicologia UCDB